Era
um grande elefante. Do alto de seu dorso, as pessoas lá embaixo pareciam incrivelmente
pequenas. Lá ia ele, caminhando lentamente com suas patas
gigantes. Esse elefante ilustrava a capa de alguns livretos turísticos da
cidade de Nantes, na França e levava as pessoas para muitas viagens. Eu viajei
no tempo, para quando subi pela primeira vez num elefante, para quando mesmo
sobre um elefante, eu é que era pequena e as pessoas lá embaixo eram grandes.
O elefante de
Nantes é um elefante mecãnico, de proporções bem maiores que a de um elefante
real. Lá de cima, era como estar no alto de um prédio de três ou quatro
andares. Ele ia, com seus passos mecânicos, caminhando rumo a um grande
carrossel. Tudo remete a um tempo em que a ciência inspirava a ficção, com ares
de Julio Verne, que vivia, não por acaso, em Nantes. Uma recriação de um século
XIX futurista. O elefante mecânico abria caminho com sua tromba, com ela
lançava água e as pessoas, crianças de quatro a oitenta e quatro anos,
simplesmente se divertiam com aquilo tudo, seja sobre o elefante, seja ali
embaixo, tão pequenas.
O outro
elefante, era um elefante de verdade. Um filhote de elefante, para ser mais
específica. Usado para atrair o público para a inauguração de um grande
supermercado que há muito muito tempo já mudou de nome, nos dias de hoje a
Associação Protetora dos Animais não teria provavelmente permitido que uma
centena de crianças montassem nele e desmontassem durante um dia inteiro. Eu
fui uma dessas crianças. De estar ali em cima, no alto de meus quatro anos de
idade, só me lembro do pinicar dos pelos do elefante e de pedir ao meu pai para
descer. Melhor era ficar lá embaixo perto das pessoas incrivelmente grandes.
O grande
elefante de Nantes, embora há muito eu tenha deixado de ser uma criança de
quatro anos, tinha me feito mais feliz.
Dias depois,
outra grande escalada me levaria às alturas concreta e simbolicamente.
Primeiro, é preciso situar : Falo da Torre Eiffel. Por conta dias já mais
longínguos em que era preciso contar moedas para ter literalmente o pão de cada
dia, um dia estar em um lugar tão mundialmente desejado como Paris era algo que
ficava num mundo tão fantasioso quanto eram as obras do já citado Julio Verne.
Quis o destino – e convenhamos, quis eu mesma acima de tudo -, que esses dias
ficassem para trás. E seja lá ou destino ou eu mesma, sei lá, permitiu que eu
colocasse meus pés pela quarta vez na Cidade Luz em menos de quatro anos. A
primeira aconteceu quase que por brincadeira : Numa conversa em que não se
sabia quem iria ser mandado para um curso na cidade eu disse « se quiser, manda
eu ». E me levaram a sério. Da segunda, foi uma passagem pela casa de um
amigo feito nessas minhas caminhadas. Da terceira, igualmente outro amigo, mas
com outro sabor, pois a paixão pela experiência de finalmente ter conhecido
Londres (um sonho muito mais desejado em dias em que as moedas eram contadas,
mas a biblioteca do bairro deixava que eu viajasse gratuitamente através de
seus livros que me levavam a essa cidade) ainda era forte demais para que eu me
deixasse encantar mais uma vez por Paris. A quarta foi esta última, quando
voltei a ama-la e resolvi que já era hora de subir na torre que no final de contas,
representa toda a França, embora seja, provavelmente, o lugar onde menos se
fala francês em todo o país.
Subir na Torre
Eiffel está longe de ser igual ao que se vê nos filmes. Nos filmes, há sempre
algum casal apaixonado, não há filas de quase duas horas, não há aperto no
elevador, não faz frio e chuva ao mesmo tempo. O tal casal simplesmente aparece lá no alto, a sós, com
uma taça de champanhe, sem mais ninguém ao redor. Eu subi sem
ter um par romântico, estava simplesmente só, aproveitando um dia em que decidi
ficar enquanto minha familia, representada por meu irmão (que nem tinha nascido
quando eu subi no tal elefante do supermercado), sua mulher, meus dois
sobrinhos, a cunhada e a sogra dele foram ao Parque Asterix (O mesmo Asterix
que eu devorava durante a adolescencia na mesma biblioteca de minhas viagens). O elevador lotado parou no segundo andar.
Dali, já se ve a cidade e o Sena e tudo aquilo ajuda a se desconectar
daquele movimento de tantos turistas, que só me chamavam a atenção quando
falavam mais alguma língua desconhecida. Torre de Babel.
Mais
um elevador para o topo. Daquele ponto, já não se viam pessoas pequenas ali
embaixo, porque elas há muito tinham desaparecido. Do alto da Torre Eiffel,
Paris parece ser uma grande maquete. Até mesmo a Torre de
Montparnasse, que pretende ser um local para se ter uma vista panorâmica, fica
pequena. A neblina passava por cima de Paris. Um grupo comprava champanhe a
quinze euros para toma-lo em taças de plástico. E como fazia frio ali !
Mas não importava. Eu não tinha levado simplesmente duas horas e meia para
chegar ao topo da Torre Eifel. Eu tinha levado muitos anos e muitas histórias
aconteceram entre os dois elefantes. E que o melhor era saber que outras
viagens seriam muito mais possiveis e não ficariam reduzidas a meros sonhos.