terça-feira, 16 de junho de 2015

Pé na Lama....


Hoje enfiei o pé na lama. Depois de tanto tempo bem comportada na capital, vivendo um dia de cada vez à espera de uma oportunidade para fazer algo que realmente dê sentido à minha existência, ao menos ao que se refere ao motivo de eu estar aqui, acabou acontecendo.

Sim, hoje enfiei o pé na lama. Os dois pés, melhor dizendo.  Daquele jeito que só esfregando com uma daquelas buchas que ainda encontramos na feira. Bom, na feira da minha terra, pois aqui são outros quinhentos.

Deixei a capital rumo à um vilarejo que em época de chuva transforma-se em um grande charco, o que por sinal caracteriza boa parte do território neste país em época de chuvas. E lá fui eu, acreditando que após quase uma semana sem chuva por aqui, minhas Havaianas, que tanto orgulho me dão quando vejo os produtos dessa marca tão brasileira em pés de gente representando as mais diversas nacionalidades, até porque depois da Copa do Mundo e da atual zona que está nossa política as opções de orgulho nacional vem se restringindo, pois as minhas Havaianas aqui estavam em meus pés e bastariam para uma pequena caminhada de menos de quinhentos metros. Só que não. E foi assim que enfiei o pé na lama.

Esta criatura da Selva de Pedra, capaz de beijar o asfalto depois de muitos dias de mato, pensa então : Estou mesmo enfiando o pé na lama ? Literalmente, sem dúvida alguma. Afinal, as condições geológicas e meteorológicas convidam para essa nobre experiência. Não tem gente que viaja a lugares ditos terapeuticos para esfregar lama no corpo todo e pagam horrores por isso ? Aqui lama é o que não falta. Vi meus pés – e minhas Havaianas -, envoltas de uma massa argilosa, porque afinal, galochas são para dias de chuva, não ?

A coisa é que, apesar desse retrato e dessa experiência tão literal de ter meus pés atolados num lamaçal,  uma sensação totalmente oposta ao significado pejorativo de enfiar os pés na lama veio quando pensei no que afinal, eu vim fazer aqui.  Uma daquelas sensações de orgulho, de finalmente sair do conforto da capital, onde por sinal eu já estava a contragosto, para trabalhar com a gente que nasceu e cresceu nessas condições que são tão, mas tão distantes do que imaginamos como um lugar para viver.

Mas as pessoas vivem sim aqui à sua maneira, caminham pelos charcos sem botas de borracha e em meio a tanto modismo do lado de lá do mundo em que pode-se encontrar tais botas pelo preço que mal cobriria um ano de trabalho de quem aqui vive, me vejo com um sentimento de uma estranha riqueza. Riqueza por cá estar, por oferecer alguns aprendizados tão acadêmicos e pessoais e muito mai,s por aprender imensamente com essa gente.

Tenho observado que desde que comecei a escrever esse blog, havia no começo um relato mais humorado de como eu vivia, do meu cotidiano para depois passar a ser algo mais reflexivo. Talvez eu esteja ficando velha e intimista (mais ainda do que eu sempre fui ?). Talvez seja porque as sensações que vivo com essas experiências seja o que tem mais tenham me fascinado. É como aquela propaganda do cartão de crédito : Algumas coisas não tem preço.

E como tenho ficado mais velha, é verdade que questões práticas assolam meu pensamento mais racional, voltadas à aquisiçao de um patrimônio, porque afinal é preciso ter um teto para cair morta, mas o que sei é que o dia em que eu parar quieta (e não sei se em poucos meses ou ainda em alguns anos, porque as coisas que me movem vão variando), o que dará valor a esse espaço não será o valor do metro quadrado, mas tudo o que eu puder colocar la dentro que possa representar, de alguma forma, muitas pessoas e histórias vividas desse lado do mundo que eu tenho o privilégio de conhecer.

Quando eu estou reunida com gente daqui, sempre gosto de dizer que eu não estou lá para impor nenhum conhecimento, mas que iremos aprender juntos. Porque é isso mesmo. Continuarei, portanto, a enfiar o pé na lama !

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